sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

As muito feias que me perdoem...

A frase de Vinicius de Moraes: "As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental" é de extremo mau gosto! Nem sempre os gênios acertam...
Pior ainda, é que ele disse "muito feias". Nenhuma mulher reclamaria, pois seria admitir ser "muito feia" o que jamais elas fariam.
Qual sua opinião a respeito?

Quem quiser conhecer o poema inteiro. segue:


Receita de mulher
As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental. É preciso
Que haja qualquer coisa de flor em tudo isso
Qualquer coisa de dança, qualquer coisa de haute couture
Em tudo isso (ou então
Que a mulher se socialize elegantemente em azul, como na República
Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível. É preciso
Que tudo isso seja belo. É preciso que súbito
Tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto
Adquira de vez em quando essa cor só encontrável no terceiro minuto
da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche
No olhar dos homens. É preciso, é absolutamente preciso
Que seja tudo belo e inesperado. É preciso que umas pálpebras cerradas
Lembrem um verso de Éluard e que se acaricie nuns braços
Alguma coisa além da carne: que se os toque
Como no âmbar de uma tarde. Ah, deixai-me dizer-vos
Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro
Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
Com olhos e nádegas. Nádegas é importantíssimo. Olhos então
Nem se fala, que olhe com certa maldade inocente. Uma boca
Fresca (nunca úmida!) é também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos
Despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas, e as pontas
pélvicas
No enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é porém o problema das saboneteiras: uma mulher sem
saboneteiras
É como um rio sem pontes. Indispensável.
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida
A mulher se alteie em cálice, e que seus seios
Sejam uma expressão greco-romana, mas que gótica ou barroca
E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral
Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas que haja um certo
volume de coxas
E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima
penugem
No entanto, sensível à carícia em sentido contrário. É aconselhável na
axila uma doce
relva com aroma próprio
Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!).
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos
De forma que a cabeça dê por vezes a impressão
De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos
Discretos. A pele deve ser frescas nas mãos, nos braços, no dorso, e na
face
Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura
nunca inferior
A 37 graus centígrados, podendo eventualmente provocar queimaduras
Do primeiro grau. Os olhos, que sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e
Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão
Que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta
Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher de sempre a impressão de que se fechar os olhos
Ao abri-los ela não estará mais presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos
fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale
sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação
inumerável.
Vinícius de Moraes
Bibliografia:
MORAES, Vinicius de. Poesia Completa e Prosa. Rio de Janeiro. Editora Nova Aguilar,
S/A, 1986.

5 comentários:

Ji Salles... disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ji Salles... disse...

Como a beleza está nos olhos de quem a vê... Então na verdade acho que ele retrata a visão dele no poema...
Gosto quando ele fala dos olhos nesse poema "Os Olhos então nem se fala"... Afinal de contas, eles são as janelas da alma...
A beleza então estás nos olhos de cada um... Isso é algo muito relativo, cada um tem seu padrão de beleza, outros então, qdo apaixonados, acabam até esquecendo do seu padrão de beleza...
Acho que a mulher deve se sentir bem com ela mesma, não importa as opniões alheias, porém se uma mulher estiver com sua auto estima meio em baixa e acabar lendo esse poema, certamente ao fim do poema estará se sentindo uma "muito feia" ... =]

Anônimo disse...

Eu sou suspeita para falar pois sempre gostei de Vinícius de Moraes, aprendi o soneto de fidelidade desde de mocinha, mas confesso que nem sabia que esta frase"As feias que me perdoem,mas beleza é fundamentel" fosse dele!!
Há, coitadinho, todo mundo erra! Na verdade não é um erro, e sim o ponto de vista dele.
Dá um desconto Marcão.
Abraços e cheiros.

Rozana A. Marcondes

Beto, O Mariano!!! disse...

O poeta não estava falando da beleza física simplesmente. A beleza feminina se expressa principalmente no seu comportamento, gestos, modo de andar, no vestir-se (com elegância, não necessáriamente com grife) e essas coisas todas. Isso fica bem claro no verso que diz: "Alguma coisa além da carne: que se os toque".

Magda Lima disse...

Concordo..............